O impacto da Lei 14.112/2020 no soerguimento das empresas em crise frente à pandemia

Dezembro 2, 2021
GABRYELLA SALES

Como é da ciência de todos, infelizmente estamos vivendo um caos econômico-financeiro que está longe de ser controlado, proporcionado, principalmente, pela pandemia enfrentada em meio global pela disseminação em massa do Novo Coronavírus – COVID 19.

É corriqueiro, não só na vida dos brasileiros, mas também, na vida de toda população global, as inúmeras notícias jornalísticas a respeito dos milhares de novos casos de infectados, dos milhares de óbitos, do colapso do sistema de saúde, bem como dos inúmeros empresários que se veem obrigados a fechar as portas de suas empresas por não terem condições de dar seguimento a suas atividades empresariais.

Um levantamento divulgado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), na data de 01.03.2021, apontou que 75 mil estabelecimentos comerciais com vínculos empregatícios fecharam as portas no Brasil em 2020, primeiro ano da pandemia[1], e lamentavelmente, a tendência dessa proporção é aumentar no ano de 2021.

Assim, a crise econômica causada pelo coronavírus trouxe uma preocupação especial com as empresas, algumas já em dificuldade financeira até mesmo antes do início da pandemia, situação que impulsionou a necessidade da aprovação e sanção da Lei 14.112/2020.

A Lei 14.112/2020, sancionada pelo presidente da República em 24 de dezembro de 2020, entrou em vigor em 23 de janeiro de 2021 e o seu principal objetivo é trazer mais segurança jurídica, celeridade, efetividade e maior chance de recuperação para empresas que estão passando por crise e optam pelo instituto da Recuperação Judicial para preservar suas atividades e, consequentemente, permanecerem no mercado.

A proposta do presente artigo é expor as principais alterações sofridas pela Lei 11.101/2005 com o sancionamento e vigência da Lei 14.112/2020, assim como demonstrar o impacto que essas alterações irão proporcionar ao soerguimento empresarial e econômico das empresas em crise.

Em linhas gerais, o instituto da Recuperação Judicial é um recurso que pode ser utilizado pelo empresário que tem uma empresa que está passando por dificuldades financeiras e tem por objetivo viabilizar a superação da crise econômico-financeira, com o fim de permitir a manutenção da fonte produtora, o emprego dos trabalhadores, os interesses dos credores, promovendo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

Deste modo, levando em consideração a grave situação que estamos vivendo, optar pelo ajuizamento da Recuperação Judicial será a “saída” de vários empresários brasileiros para preservar suas empresas, suas fontes de renda e até mesmo, a economia brasileira, o que por si só demonstra a importância das inovações trazidas pela Lei 14.112/2020.

De um modo geral, a lei proporciona a modernização do sistema jurídico da Recuperação Judicial e da Falência, de modo a torná-lo mais transparente, célere, eficaz e com grandes melhorias quanto a recuperação de crédito, o que evidentemente trará impactos positivos sobre a economia do país.

Dentre as principais alterações validadas com a finalidade de trazer mais celeridade e transparência ao processo de Recuperação Judicial e Falência temos: a contagem de prazos em dias corridos; a prioridade dos processos de insolvência sobre todos os atos judiciais, salvo o habeas corpus e as prioridades estabelecidas em leis especiais; período de 180 dias de suspensão (stay period) de execuções contra o devedor prorrogável somente uma única vez por igual prazo; encerramento da Recuperação Judicial mesmo que não tenha ocorrido a formação do Quadro Geral de Credores, sendo que as ações incidentais de habilitação e de impugnação retardatárias serão redistribuídas ao juízo da recuperação judicial como ações autônomas e observarão o rito comum; decadência, caso o credor não apresente em até três anos o pedido de habilitação ou de reserva de crédito a partir da publicação da sentença que decretar a falência; instituição de procedimento de conciliação e mediação antecedente à recuperação judicial, com previsão de suspensão por até 60 dias de execuções contra o devedor; dever do Administrador Judicial de manter endereço eletrônico com os principais documentos e informações dos processos, devendo receber habilitações de crédito e divergências de modo virtual; possibilidade de substituição da Assembleia Geral de Credores por termo de adesão firmado por tantos credores quantos satisfaçam o quórum de aprovação específico; realização da Assembleia Geral de Credores por sistema eletrônico que reproduza as condições de tomada de voto ou outro mecanismo considerado suficientemente seguro pelo juiz; proibição do devedor de distribuir, até a aprovação do plano de recuperação judicial, lucros ou dividendos a sócios e acionistas, sob pena de crime falimentar.

Já no que concerne ao objetivo de garantir maior eficácia e possibilidade de soerguimento das empresas em crise, merece destaque os seguintes pontos trazidos pela Nova Lei:

  • Aumento do prazo de parcelamento dos débitos com a União – a Lei 14.112/2020 também promoveu alterações na Lei 10.522/2002, sendo a ampliação do prazo para parcelamento de dívidas com a Fazenda Nacional para 120 (cento e vinte) meses uma das principais mudanças para as empresas em Recuperação Judicial, uma vez que a medida visa propiciar um ambiente mais favorável à quitação das dívidas tributárias;
  • Possibilidade de apresentação de plano alternativo pelos credores – com o advento da Lei 14.112/2020 os credores poderão apresentar plano alternativo se o devedor, após a prorrogação do stay period, não conseguir colocar em votação um plano ou se, após a rejeição do plano em assembleia, os credores votarem pela concessão de prazo de 30 dias para sua apresentação, trazendo maior legitimidade ao credor e menor risco de Falência do devedor por falta de aprovação do plano de recuperação.
  • Possibilidade de Recuperação Judicial do Produtor Rural – a Lei 14.112/2020 estabelece condições para que o produtor rural possa requerer recuperação judicial, sendo que estão sujeitos aos seus efeitos os créditos decorrentes da atividade rural discriminados nos documentos fiscais e contábeis, de modo a possibilitar ao produtor rural optar por um plano de recuperação especial similar ao destinado aos microempresários individuais desde que o valor do passivo não exceda R$ 4,8 milhões de reais.
  • Regulamentação de modalidade de financiamento especial para empresas em Recuperação Judicial “DIP Financing” – sem dúvida uma das principais inovações trazidas pela Lei, o chamado DIP Financing é uma modalidade de financiamento para empresa que se encontra em processo de Recuperação Judicial, garantido pela oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não circulante, que possui a finalidade de manter o fluxo de caixa para financiar as despesas operacionais, de modo a assegurar condições necessárias para o cumprimento do plano de recuperação.
  • Dilação de prazo para pagamento dos credores trabalhistas – a nova Lei flexibilizou o prazo para pagamento da classe trabalhista para 02 (dois) anos e, considerando o tratamento privilegiado desta classe, ampliou as possibilidades de negociação e busca por soluções quanto à renegociação da dívida, garantindo ao procedimento recuperacional eficácia e segurança jurídica.
  • Possibilidade de venda integral da devedora – novação quanto aos meios de Recuperação Judicial. A Nova Lei passa a prever como meio de recuperação judicial a venda integral da devedora, que será considerada para os fins legais como unidade produtiva isolada, afastando do terceiro credor, do investidor ou do novo administrador, a sucessão ou responsabilidade por dívidas de qualquer natureza em decorrência, respectivamente, da mera conversão de dívida em capital, de aporte de novos recursos na devedora, ou de substituição dos administradores desta; ampliando e incentivando a participação de credores e investidores na reestruturação da dívida e da operação da devedora.[1]

Neste diapasão, em tempos de crise como estamos vivendo atualmente e após as inovações trazidas pela Lei 14.112/2020, o instituto da Recuperação Judicial é uma ótima alternativa para empresas buscarem sua revitalização, não só a benefício próprio, como também, em benefício de toda sociedade, tendo em vista sua finalidade de diminuir os impactos econômicos decorrentes da pandemia e, consequentemente, manter o bom desempenho da economia nacional.

Em razão das medidas protetivas de combate ao coronavírus várias empresas tiveram que suspender suas atividades em decorrência de decretos estaduais com a finalidade de evitar aglomerações e contaminação.

Segundo dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mais de 43% das indústrias sofrem com impacto da pandemia em seus negócios, seguida pelo comércio que teve seu faturamento reduzido em 35% e os serviços em 30,2%[2], podendo essas proporções sofrerem aumentos gigantescos no ano de 2021, razão pela qual é de extrema importância que as empresas tenham conhecimento do amparo proporcionado pela Lei de Falência e de Recuperação Judicial, recentemente alterada pela Lei 14.112/2020.

Portanto, as alterações trazidas pela Lei 14.112/2020 visam impactar de forma positiva as empresas que estão passando por crise econômico-financeira capaz de justificar um pedido de Recuperação Judicial, ou, até mesmo de autofalência, pois, proporcionam maior efetividade, celeridade e segurança jurídica para os credores, investidores e empresários na reestruturação e na reabilitação financeira da atividade empresária, uma vez que trazem novas alternativas para a solução da crise, mantendo as empresas no cenário econômico de modo a estimular a manutenção dos empregos, renda e geração de impostos.

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