Quais os instrumentos jurídicos as empresas possuem para evitar a falência?

Dezembro 2, 2021
FELIPE SALAS

Pesquisas apontam que, apenas em 2020, os pedidos de falência cresceram 12,70% e as falências decretadas 1,90%, em comparação com 2019[1]. É a primeira vez que o país registra aumento no número de processos de insolvência desde o fim do período de recessão do Governo Dilma, em 2015 e 2016.

Os dados retratam o impacto da crise da Covid19 no setor empresarial brasileiro, vez que grande parte das empresas tiveram sua atividade atingida pelo cenário atual de agravamento da pandemia.

Em 2020, com o início da crise, houve a promulgação de diversas medidas protetivas, dispondo de maiores prazos para renegociação de dívidas, prorrogações, além da própria flexibilização de regras trabalhistas, controle de juros, pagamento do auxílio emergencial e novas regras de apoio para as micro e pequenas empresas.

Ocorre que, apesar de todas as medidas protetivas promulgadas, a própria duração prolongada da crise resultou em aumento significativo nos pedidos de falência. Não fosse apenas isto, considerando o número de pedidos já apresentados em 2021, a expectativa para o término do ano é de um aumento significativo de novas falências por empresas de diversos setores da sociedade.

Não obstante, apesar da existência de concessão de subsídios governamentais para o soerguimento das empresas em crise, é de notório conhecimento a existência de outros instrumentos jurídicos fundamentais para a manutenção da atividade empresarial de empresas economicamente viáveis.

A preservação das empresas visa possibilitar novos investimentos, maximizar a recuperação de créditos, criação de novos postos de empregos e, por fim, estimular a economia de nosso país, de sorte que as ferramentas para a manutenção da atividade empresarial são institutos fundamentais do ordenamento jurídico brasileiro.

A proposta do presente artigo, neste sentido, é analisar a atual conjuntura dos instrumentos jurídicos alternativos à falência, evidenciando a possibilidade de soerguimento de empresas economicamente viáveis mesmo durante a atual crise causada pelo agravamento da pandemia da Covid19.

Com relação aos procedimentos de insolvência nacional, ressalta-se a utilização de dois principais instrumentos, além do procedimento falimentar, para a superação da crise empresarial: a Recuperação Judicial e a Recuperação Extrajudicial de empresas.

O processo de Recuperação Judicial de empresas tem por objetivo viabilizar, através do Poder Judiciário, a negociação ordenada entre a empresa devedora e os seus credores, com o propósito de reorganizar a sociedade empresarial e viabilizar a continuidade das suas operações.

Insta salientar, ainda, que as recuperações judiciais do país mantiveram o alto volume de 2020. Apenas no primeiro trimestre já são mais de 217 pedidos de Recuperação Judicial, segundo dados divulgados pela pesquisa do Serasa Experian[2]. O número de pedidos em fevereiro também é 11% maior em comparação ao mesmo mês do último ano, retrato da própria extensão dos impactos econômicos ocasionados pela crise da Covid-19.

A Recuperação Judicial, regulada pela Lei nº 11.101/05, firma-se, portanto, como instrumento evidentemente viável para o soerguimento de empresas, que, através do processo judicial atingem a necessária reestruturação.

Ainda, as mudanças introduzidas no ordenamento pelarecente Lei nº 14.112/20, que atualiza a Lei de Recuperação e Falências, também tornaram o procedimento mais atrativo às empresas em crise, haja vista que o procedimento confere maior segurança jurídica, celeridade, efetividade, potencial de atração de investimentos e maior chance de soerguimento das empresas que optarem pelo instituto da Recuperação Judicial para preservar suas atividades.

O ordenamento jurídico brasileiro confere à empresa insolvente, também, outro instrumento para superar a crise de liquidez, que é a Recuperação Extrajudicial. Tal instituto, previsto pela Lei nº 11.101/05, em seus artigos 161 e seguintes, existe para conferir solução para a recuperação das empresas em dificuldades financeiras com procedimento ainda mais célere e de baixo custo em comparação com a Recuperação Judicial convencional.

Com relação ao instituto da Recuperação Extrajudicial, pontua o Prof. Fábio Ulhoa Coelho: “até a entrada em vigor da nova Lei de Falências, o direito brasileiro não estimulava soluções de mercado para a recuperação das empresas em estado crítico. Isto porque sancionava como ato de falência qualquer iniciativa do devedor no sentido de reunir seus credores para uma renegociação global das dívidas (…). Com a nova lei, muda-se substancialmente o quadro. Ao prever e disciplinar o procedimento da recuperação extrajudicial, ela cria as condições para a atuação da lógica do mercado na superação de crises nas empresas em crise”.

A Lei nº 11.101/05 permite, para tanto, que o empresário em crise econômico-financeira possa propor e negociar um plano de recuperação diretamente com os credores, ocasião em que novos prazos e valores poderão ser estabelecidos a fim de verificar viabilidade ao contínuo da atividade empresarial, desde que preencha todos os requisitos previstos pelo Artigo 48 da legislação mencionada, quais sejam: I) exercer atividade empresarial por mais de dois anos, de forma regular; II) não ser falido ou, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes; III) não ter recuperação judicial em curso, nem ter obtido recuperação judicial ou homologação de plano de recuperação judicial há menos de dois anos; e IV) não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes estipulados por lei.

A Recuperação Extrajudicial traduz-se em verdadeiro acordo de vontade entre as partes da relação jurídica, vez que todo o procedimento visa diminuir as interferências externas ao dispensar o envolvimento do Ministério Público e a própria nomeação de Administrador Judicial, o que garante maior celeridade e baixo custo ao procedimento.

Ainda, o próprio modelo de Recuperação Extrajudicial abarca a possibilidade de o procedimento ser realizado através de Mediação, o que garante, também, celeridade ao método, visando substituir a custosa e burocrática judicialização do processo de insolvência, em consonância com o disposto pela Recomendação nº 58/2019 do Conselho Nacional de Justiça:

“Art. 1º Recomendar a todos os magistrados responsáveis pelo processamento e julgamento dos processos de recuperação empresarial e falências, de varas especializadas ou não, que promovam, sempre que possível, nos termos da Lei nº 13.105/2015 e da Lei nº 13.140/2015, o uso da mediação, de forma a auxiliar a resolução de todo e qualquer conflito entre o empresário/sociedade, em recuperação ou falidos, e seus credores, fornecedores, sócios, acionistas e terceiros interessados no processo.”

Verifica-se evidente que tanto o procedimento de Recuperação Judicial, quanto a Recuperação Extrajudicial e mediação existem como instrumentos jurídicos fundamentais que visam oportunizar ao empresário o soerguimento em momentos de crise econômica, como a que vivenciamos atualmente, estabelecendo critérios objetivos que possam sustentar tanto a preservação da atividade empresarial quanto à recuperação do crédito pelos credores.

Tais instrumentos serão ainda mais utilizados por empresas insolventes nos próximos anos em decorrência do atual cenário, razão que demonstra ainda mais a necessidade e importância de constante aperfeiçoamento e conhecimento desta ferramenta de gestão que se encontra disponível para o empresário e as empresas em dificuldades financeiras.

  Murillo Lobo Advogados Associados  

Rua 1.132 nº 104, Setor Marista,
Goiânia-GO, Cep: 74.180-110
Fone: (62) 3501-2900

Av. Paulista, N° 777, 15° Andar, Bela Vista
São Paulo-SP, Cep: 01311-100
Fone: (19) 3368-2815

© 2021 Murillo Lobo Advogados Associados